sábado, 20 de março de 2010

A Reformadora do Mundo





É, nem sempre é fácil sorrir. Quando se olha à volta e se vê desesperança.
Num mendigo caído na rua ou num choro fraco de uma criança que tem fome.
Não, não é fácil sorrir, quando se vê tantas guerras, discórdias, fome, desabrigo, falta de amor.
Não, não é nada fácil sorrir quando o sol se levanta e o corpo ainda dorme e a vontade é de ficar, bem encolhidinha na cama quente.
Quando a vida nos chama e não queremos ouví-la, pois ainda não estamos preparados para enfrentar mais um dia. Preferimos, então, fechar os olhos e fingir que ainda é noite, que podemos simplesmente voltar a dormir em paz.
Ah... a cama ainda é o melhor lugar para o derrame das lágrimas que escorrem pela face, mornas, encharcando o travesseiro.
Por que tanta dor vem de dentro, das entranhas esse lamento lento, que parece não ter fim?
Será que sou eu que sou sensível demais?
Será que sou eu que sou assim e não consigo ter paz?
Não, calma, não sou inocente assim, nem poderia mais na minha idade. 
Já me fiz essas perguntas sim, mas quando era uma criança e me achava diferente das demais. E quando chorava sozinha encolhida no cantinho do meu quarto.
Claro que não sou só eu, eu sei...
Seria preciso que só eu fosse humana, perdida entre humanóides insensíveis.
Mas me lembro que quando criança às vezes voltava pra casa chorando. Muitas vezes...
Minha mãe perguntava o porquê, meio que sem interesse, e eu dizia que vira um cachorro abandonado ou uma criança faminta na beira da calçada ou um mendigo na sarjeta ou, quem sabe ainda um bêbado cambaleante encharcado de cachaça.
Ela sorria e dizia, com certao imaciência: Você quer ser a "Reformadora do Mundo"?
"Reformadora do Mundo", eu? O que será isso?
Então, resolvi perguntá-la e ela me disse de forma simples que é alguém que quer mudar as coisas que acha erradas no mundo.
Então, nesse momento uma luz brilhou em meus olhinhos infantis e eu disse: Quero, sim!
Com veemência.
Ela sorriu de novo e respondeu: Você nunca vai conseguir mudar as coisas. Elas são assim porque tem que ser. Você só vai  é sofrer.
Minha cabeça rodou com essa resposta inesperada; fiquei confusa. Duvidei que ela estivesse certa.
O tempo foi passando, a vida foi passando e eu fui crescendo e com o crescimento o  amadurecimento foi chegando, o que é natural.
Compreendi, então, o que minha mãe quis dizer.
Compreendi a grandeza de minha utopia. O meu sonho, minha fantasia.
Eu... uma pequena garotinha.
A vontade de reformar o mundo, em mim nunca morreu.
Hoje, sei o quanto é difícil mudar até a própria vida, quanto mais mudar o mundo!
Sei que é imposível destruir o mal, pois se existe o mal é porque existe, em contrapartida, o bem. A vida é feita de opostos, não é mesmo?
Sendo assim, vivo minha vida do jeito que posso, então ... sobrevivo e convivo com as minhas dores, que não são só minhas, são dores do mundo.
Não vou dizer que não sofra mais, que tenha perdido a sensibilidade da infância, que tenha se esvaído a vontade de fazer algo pra ajudar a mudar o mundo, mas não volto mais pra casa chorando, quase todos os dias.
Lembro-me de uma frase de Che Guevara, da qual gosto muito: " Há que endurecer sem perder a ternura".
E é isso que a vida faz, nos prepara para conviver com as dores, para sobreviver à elas e se não tivermos forças pra suportá-las, pereceremos. Precisamos muitas vezes endurecer nossos corações por uma questão de sobrevivência, mas a nossa essência permanece em nós.
Acredito que a nossa essência, realmente, não muda.
Assim, a minha continua a mesma, apenas aprendi a conviver com ela e com os sentimentos que ela me traz.


Ianê Mello

Ouça: Kitaro "Planet"

8 comentários:

aapayés disse...

Siempre es un inmenso placer pasar a leerte querida amiga..


Un beso

Un abrazo
Saludos fraternos..

Que disfrutes de un buen fin de semana..

Ianê Mello disse...

Payés,

sempre presente, o que me alegra.


Obrigada.

Besos.

IVANCEZAR disse...

Quem sabe seja aquilo que definimos como a índole ... são tantas e tão inquietantes as teses acerca da essência do ser e a influência do meio no agir racional. Enfim, daria para várias horas à volta de uma mesa, não é mesmo Iane - com um bom chá ou até um chopinho gelado . Daria mesmo para se deliciar com o tema, assim como delicioso ficou o texto . Beijo amiga !

Unknown disse...

Não quero ser repetitivo, mas este outro blog seu, com este brilhante texto "A Reformadora do Mundo", é algo em profundo belíssimo, maravilhoso!!!!
Pra se ter um blog, é preciso talento e sensibilidade, eu já tentei ter vários, mas hoje não tenho porque ser dono de um blog, ao meu entender, é ser um artista nas palavras e em expressar sentimentos, e você certamente possui o dom da arte de escrever.

Continue sempre assim, sensível e honesta com sua alma, que sua inspiração jamais terminará!

Você está de parabéns!

Grande Abraço!

Mario Luiz.

A.S. disse...

Ianê...

Hoje quero expressamente deixar um sublinhado muito especial à tua capacidade de desenvolver uma imensa variedade de temas e formas poéticas que revelam não só o teu talento, como a tua verdadeira e grande paixão pela poesia!
Pode dizer-se, que é relevante a tua obra no panorama literário!

Um grande abraço Poeta!!!
AL

Ianê Mello disse...

Ivan,

você tem toda razão.

Fiquei feliz com sua visita.

Beijos, meu amigo.

Ianê Mello disse...

Mario,

fico feliz por estar tocando a alma de pesssoas sensíveis como você, pois é preciso sensibilidade, amigo, para ler nas entrelinhas.

Volte sempre e obrigada.


Grande abraço.

Ianê Mello disse...

Albino,

esse elogio vindo de você, Poeta, me causa grande alegria.

Obrigada.

Um abraço amigo.