sábado, 19 de dezembro de 2009

A Mão que apedreja





Filhos, os temos
Mulheres que somos
Gerados por nós
Paridos por nós
De suor e sangue
e lágrimas de dor
A dor do parto
Lancinante e aguda
Mais profunda que
outra dor humana qualquer
Parece que estão a arrancar
de dentro de nosso corpo
algo que nos pertence
o que não deixa de ser
pois em nós se desenvolveu,
em nosso útero se formou
até estar pronto para vir ao mundo
Aí então, não mais nos pertence
Nosso controle sobre ele
passa a ser relativo


E que filho é esse
que botamos nesse mundo?
Isso não se sabe
Não há como prever
Mas o certo é que
a mão que é  afagada
é a mesma que apedreja
E esse filho que hoje afagamos,
que aninhamos em nossos braços,
pode um dia nos atirar pedras
Não pétalas de flores
como forma de gratidão
Mas duras e pesadas pedras
que suportam em suas mãos
movidas pela incompreensão,
pela revolta, pelas falhas que cometemos
Pelos nossos limites que não sabem aceitar
Como dói em nós recebê-las,
pois se erramos foi tentando acertar
A dor ainda maior se dá
quando temos que revidá-las...




Por amar...


Por amor...




Ianê Mello



8 comentários:

Akhen disse...

Ianê

Dividindo o poema em duas partes. A primeira é assim, mas é uma dor que como se diz por cá "Dor parida é dor esquecida". Fica o amor sublime da mãe pelo filho.
A segunda, muitas vezes acontece. E se da parte da mãe, a compreensão deve ser total para com o filho, o filho deve retribuir do mesmo modo.
Lembra-me a parábola que existe em todas as religiões:
"Este é o meu filho que estava perdido e o encontrei."
Só não conheço a correspondente:
"Esta/e é a minha/meu mãe/pai, de que eu estava perdido e fui encontrado".
O amor dos pais (falo pelos meus) é ou deveria ser infinito.
A inversa também deveria ser verdadeira.

Paz e Luz para iluminar os seus passos

Ianê, depois deste poema, por si e para si, vou colocar uma coisa que escrevi para uma pessoa amiga.

Paz e Luz

Ianê Mello disse...

Akhen

Como sempre, você capta a essência do poema com muita perspicácia.

Só quero esclarecer que sou mãe e de duas filhas.

O que escrevi nesse poema de fato retrata, acredito, não somente o que eu sinto mas o que muitas mães sentem com relação aos seus filhos em alguns momentos da vida.

A realidade que é ter(parir), gerar e contribuir para o crescimento desse filho e todas as dificuldades que encontramos para fazê-lo, além das alegrias que também existem, é claro.

Falar das alegrias é fácil, mas retratar as dores, quando nos sentimos desvalorizadas, desrespeitadas, insuficientes por mais que façamos, não é tarefa fácil.
Por isso, quis aqui abordar este aspecto da relação mãe e filho, que percebo pouco explorado a nível poético.

Seja sempre bem vindo com seus excelentes comentários.

Paz e Luz, meu amigo!

Akhen disse...

Ianê

Vá a
jim-viajantedotempo.blogspot.com

que é meu. Lá está o tal poema. No fundo é uma homenagem a todas as mães do mundo.

Uma pergunta:

Ainda que magoada e talvez mesmo ofendida, não perdoa sempre?

"Mau é o pai que não reconhece os defeitos dos filhos".

Eu sei que é boa mãe.

Paz e Luz no seu caminho

Ianê Mello disse...

Jim,

fui ao seu blog e li o belo poema que você citou.

Nele você retrata com delicadeza e beleza a maternidade.

Respondo aqui também a sua pergunta: sim, é claro que eu perdôo, pois sou mãe e humana e sei que cometemos erros e por eles devemos ser perdoados e, portanto, devemos perdoar de igual forma.

Procuro ser uma boa mãe, meu amigo.

Paz e Luz!

Elaine Barnes disse...

Belo poema.Parimos e criamos procurando dar o nosso melhor,se erramos foi tentando acertar. As mães também são filhas.Tive uma mãe muito legal que me deu liberdade,quando fui mãe entendi esse valor e dei liberdade as minhas filhas também, com orientação. Não foi um mar de rosas, claro que muitas vezes me magoei e achei que não merecia alguma malcriação, o tempo passou e vi que ser uma boa mãe é tornar-se desnecessária.Ambas estão encaminhadas, independentes e agora me ensinam. A mais velha agora me entende bem porque nasceu Davi meu neto e a mais nova por estar longe na Irlanda.Minha pequena família deu frutos. Minha pequena árvore de culpas hoje também está livre. Feliz Natal!

Ianê Mello disse...

Elaine,

nós que somos mães compreendemos e falamos a mesma linguagem.

Gostei muito do seu comentário e fico feliz em saber que se livrou das culpas.

Um natal iluminado pra você e os seus e que no ano vindouro possamos realizar antigos sonhos.

Beijo grande ,querida.

Marcelo Novaes disse...

Ianê,



Algumas consequências das ações maternas podem levar anos para ser elaboradas. Algumas erram o alvo. Algumas causam dano, inclusive. De fato. Mas, a uma certa altura da vida, enxerga-se que "a intenção da pontaria" era boa.A mãe (ou pai) não "mirou para acertar e ferir". No mais das vezes. Há exceções: há quem fira deliberadamente, e os noticiários têm apresentado quão longe estão alguns lares da idílica descrição da "família". Algumas famílias são "a primeira câmara de tortura em relação à qual se tem de sobreviver". Sem nenhum exagero. Nessas, cresce-se "apesar" da família (tendo a família como uma espécie de obstáculo a ser superado), e não "por causa da família". Há famílias que só merecem um qualificativo: lixo. Veja o número de crianças abusadas física e emocionalmente por familiares. Veja mães que fazem vista grossa (ou não evocam brios para reagir) aos abusos de toda espécie de seus "machos" às suas crianças.





Sei que o teu poema fala de uma boa mãe. E fala na primeira pessoa. Assim sendo, nada do que eu citei acima se aplica a ele. Eu o fiz só para "desidealizarmos" a flagrantemente falsa idéia que "toda família é um ninho de aconchego". Não. Um número bastante expressivo delas é onde a criança descobre os primeiros "grandes inimigos": aqueles que deveriam zelar por elas,e agridem. E invadem. A criança (tem mais de uma) transformada em "boneco de vodu" aos caprichos de duas excrescências humanas é apenas um objeto emblemático. Tratei de muitas crianças nas "periferias brabas" de São Paulo que eram sistematicamente vítimas de torturas impensáveis por vc: por pai, por mãe, por irmãos, ou por todos juntos.


Impensáveis por uma boa mãe e bom ser humano.



Sem nenhum grão de exagero.



Os que conseguem perdoar pais assim fazem um grande trabalho interno.





Beijos,







Marcelo.

Ianê Mello disse...

Marcelo,

obrigada pelas palavras.

Profundas e verdadeiras...como sempre.

É um prazer tê-lo por aqui.

Beijos, amigo.